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    AS PALAVRAS TÊM PODER?

    As palavras têm poder? Sim e não. O poder das palavras é dado muito mais por quem ouve do que por quem fala. Onde estaria, então, o poder das palavras, as quais faço uso agora?

    Creio que têm poder nos primeiros anos de vida, quando são ditas pelos pais. Nesse caso há o ingrediente da deflexão, intonação da voz, que dá o sentido emocional ao que é dito. “Amor” não seria dito com rispidez, tampouco um “não” com um sorriso meigo no rosto no momento de uma correção. Essa deflexão fará com que a criança entenda o sentido de cada palavra, mesmo que um “não” seja dado com carinho e meiguice em certos momentos.


    Na forma da Lei a palavra assume outra dimensão, o da punição, do cerceamento, da normatização. Essa tem poder pela força do Estado. Nesse caso não importa ser na forma escrita, pois mesmo assim requer a ação do agente da Lei, seja policial, seja juiz, seja um funcionário público investido de poder.


    Quando se outorga autoridade a quem fala, quando se tem respeito, admiração, a palavra é meio de motivação e de ampliação do mundo. Numa palestra o orador está nessa condição e, mesmo dizendo o que já sabemos, suas palavras nos atingem de uma forma mais intensa.


    Na condição de patrão ou chefe a palavra tem outros significados, outra dimensão. Muito semelhante com a Lei, mas com o ingrediente da relação interpessoal. Coisa que não ocorre quando somos autuados. A palavra de chefe pode ter a deflexão que nos fere. Não raro vemos casos de humilhação. Nesse momento o humilhado abriu as portas para a agressão.


    Há ainda a palavra que não tem significado objetivo como o palavrão, mas subjetivo. Certa vez um rapaz disse que outro era um “filho da puta”, aí perguntei se ele conhecia a mãe do rapaz. Disse que não, foi então que o fiz pensar no que disse: “Como você sabe que ele é um filho da puta se não conheces a mãe dele?” Nesse contexto temos o famoso “mal entendido” que pode ser revertido com uma boa conversa. Mas a palavra já havia sido dita e exigiu mais palavras para contornar o malfeito.


    Temos as palavras que não são palavras na forma que conhecemos: os sinais. Aliás, as primeiras escritas não passavam de sinais, de representações. O homem engendrou mais e mais significados, mais e mais necessidades de comunicação de muitas formas. A LIBRAS, Língua Brasileira de Sinais, é o mais forte exemplo das muitas formas que podemos dar às palavras. Antes disso tivemos o Código Morse, que com uma infinidade de pontos, como o Braile, transmitia mensagens. As placas de trânsito, faixas nas vias, setas, cores... enfim, são palavras porque ensejam ideias e “dizem” algo inteligível. Basta que quem recebe esteja devidamente informado de seu significado. Daí verifica-se que o texto só terá impacto desejado se quem lê, ou ouve, o entende. E muito mais problemas temos pela limitação do nosso povo de interpretar o que lê.


    Por outro lado, seguindo a vida, na adolescência, no ímpeto de ser dono de seus próprios passos, o jovem contraria muito do que os pais dizem. Ora, eis um dos momentos em que esse poder das palavras fica desestabilizado. O maior dos efeitos está na repetição, quando pais dizem muitas vezes algo negativo como “você será um nada na vida!”, não há como não marcar. Porém, marca muito mais pelos laços afetivos que estão envolvidos. Note que marca, não porque disse uma vez, num momento de irritação, mas porque repete ao longo de anos. Dizer coisas erradas é algo que fizemos muitas vezes e nem tudo que se diz com carga negativa resulta num mal, num trauma. Muito do que se diz cai num vazio e jamais será lembrado.


    As palavras tem de fato poder? Esse poder é outorgado por quem escuta. Disso não tenho dúvidas. Esse escutar depende de outras tantas variáveis como o momento emocional de quem ouve. É como um hino que faz chorar. Há notas musicais que tem essa capacidade. Ou aquelas cartas “psicografadas” que a mãe, cujo coração está estraçalhado, quer que seja verdade.


    Concluo, pois, que não há qualquer poder intrínseco nas palavras, sejam faladas, sejam escritas, senão na dimensão dada por quem recebe.

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