OS LADRÕES E JESUS
Estranhamente apenas no evangelho de Lucas (23.39-42) temos o célebre diálogo entre Jesus e os dois outros crucificados com ele. Em Mateus e Marcos as tais blasfêmias entram no pacote dos insultos da turba. João dá ênfase a outros detalhes como o sorteio da túnica feita pelos soldados romanos. De tantos os evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas se repetirem, e por isso são chamados sinóticos (mesma ótica), chama a atenção essa singularidade, ainda mais que Lucas, pelo que dizem os estudiosos, veio depois dos outros três, dando a entender que é uma informação resgatada a posteriori. Mas, enfim, que teria esse texto de tão importante?
"E um dos malfeitores que estavam pendurados blasfemava dele, dizendo: Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo, e a nós. Respondendo, porém, o outro, repreendia-o, dizendo: Tu nem ainda temes a Deus, estando na mesma condenação? E nós, na verdade, com justiça, porque recebemos o que os nossos feitos mereciam; mas este nenhum mal fez. E disse a Jesus: Senhor, lembra-te de mim, quando entrares no teu reino. E disse-lhe Jesus: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no Paraíso."
O texto é absolutamente limitado. Por exemplo, que crimes cometeram estes dois homens? Como foram suas vidas? Se mereceram a morte por crucificação estaríamos abonando a ''pena de morte''. O que queria dizer o sujeito com "estando na mesma condenação"? Ou seja, temos que nos limitar a tão poucas informações e isso me faz temer porque as interpretações se perdem no vazio dos "achismos". De qualquer forma arrisco-me.
A salvação do rapaz que blasfemava poderia ser um ato de misericórdia. Ora, questionar um cara que está condenado e se apresentou como Filho de Deus não te parece natural? Na agonia da morte foi absolutamente sincero, disse o que pensava. O ''bandido mal'' não creu da mesma forma que muitos de nós. Desprezamos os que nos cercam porque julgamos que suas vidas não condizem com o resultado que auferiram depois de anos. "Ué, ele não era o cara? Como deixou chegar nessa situação?" costumamos dizer. Além disso, estava no mesmo sofrimento que o ''salvador''. Se a morte de Jesus foi vicária a morte do bandido, sendo absolutamente igual, representou sua punição. A morte por cruz, comum na época, em si mesma nada representa, não tendo sido exclusividade do salvador. O sofrimento de Jesus em nada o difere dos demais. Aliás, a História está repleta de casos em que o sofrimento por tortura em muito supera a de Jesus.
Podemos também imaginar quais seriam as amarguras desse blasfemador. Sua vida pregressa pode ter sido motivada por sucessivas agressões e sua visão da vida, como contendo alguma coisa boa, tenha se perdido logo na infância. Não seria justo analisar suas motivações? Afinal, o que se espera de Deus senão que tenha compaixão e que saiba que somos vulneráveis ao meio?
Um dos personagens que mais me marcou no clássico Memorial de Maria Moura, de Rachel de Queiroz, é de um traidor que pouco antes da morte, amarrado a um tronco, recebe a visita do padre. Nesse momento da extrema unção o padre pergunta se ele ainda crê em deus e o tal diz: "Deus é luxo!" Ora, reagimos de múltiplas formas diante dos males da vida e a revolta faz parte desse contexto. Além disso, está claro que pessoas cujo lobo frontal é menor tem senso ético e moral quase inexistente. Um defeito congênito que torna o sujeito afeto ao crime, sem remorso, e por isso o condenamos nos tribunais humanos, mas de Deus esperar-se-ia outro entendimento. O ladrão da cruz é mal, e a ele não é dada a possibilidade do bem. Jesus não teve misericórdia!
Quanto ao "bandido bom" só fez por acreditar, mesmo não tendo feito reparos aos males praticados, pode-se dizer que foi um privilegiado, pois quem, na angústia da morte teve a oportunidade de um diálogo desses? Ele reconheceu que Jesus era o salvador e pronto. O cara estava na fragilidade da morte. Não teria sido um ato de desespero diante do fim iminente? Volto à vida que ele teve: que religião teria sido educado? Não sabemos. Pode ter se apegado ao que lhe pareceu ao alcance dos olhos, coisa bem comum. Afinal, ninguém clama por um deus que nunca ouviu falar. Como criminoso teve condenação nas leis do Império. Jesus por sua vez teve condenação pelo Sinédrio (juri judeu) e a decisão foi respeitada por Pôncio Pilatos porque esse era o entendimento do César, de respeitar o justiciamento do povo dominado segundo suas próprias leis. Daí o lavar das mãos representar uma política de Estado, nada mais. Se não foi reparado o mal que praticou não houve justiça e sobre isso Jesus não faz qualquer menção. Salvou o bandido sem que seus males fossem contornados. Que tipo de Deus é esse? Um Deus do bem? Com certeza não. Além de não fazer Justiça bastou uma puxada de saco para transformar um condenado em salvo.
O padrão de análise da nossa conduta por parte de Deus não poderia ser dentro dos nossos padrões. Não o foi para um, mas também não o foi para o outro que, blasfemando, poderia ter do salvador o entendimento da nossa limitação. Esse texto se encaixa perfeitamente na necessidade da religião de colocar-se como caminho único. Ora, é necessário ao cristianismo ter em si mesmo a única opção, do contrário abriria o leque e tiraria de si a autoridade no quesito 'salvação'. Jesus está no centro da decisão, não importando a vida que temos. Daí a história humana não revelar presença divina em coisa alguma e as nossas sociedades seguirem com os condicionamentos humanos permitidos por nossa própria humanidade.
Se Deus não interfere no nosso mundo, a não ser para curar uns e outros de dores de barriga e dar emprego, por que haveríamos de crer em algo superior depois desta existência? Bem, suponho que Deus não seja a manifestação cristã. Deus é outra coisa que não faço a menor ideia do que seja.
"E um dos malfeitores que estavam pendurados blasfemava dele, dizendo: Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo, e a nós. Respondendo, porém, o outro, repreendia-o, dizendo: Tu nem ainda temes a Deus, estando na mesma condenação? E nós, na verdade, com justiça, porque recebemos o que os nossos feitos mereciam; mas este nenhum mal fez. E disse a Jesus: Senhor, lembra-te de mim, quando entrares no teu reino. E disse-lhe Jesus: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no Paraíso."
O texto é absolutamente limitado. Por exemplo, que crimes cometeram estes dois homens? Como foram suas vidas? Se mereceram a morte por crucificação estaríamos abonando a ''pena de morte''. O que queria dizer o sujeito com "estando na mesma condenação"? Ou seja, temos que nos limitar a tão poucas informações e isso me faz temer porque as interpretações se perdem no vazio dos "achismos". De qualquer forma arrisco-me.
A salvação do rapaz que blasfemava poderia ser um ato de misericórdia. Ora, questionar um cara que está condenado e se apresentou como Filho de Deus não te parece natural? Na agonia da morte foi absolutamente sincero, disse o que pensava. O ''bandido mal'' não creu da mesma forma que muitos de nós. Desprezamos os que nos cercam porque julgamos que suas vidas não condizem com o resultado que auferiram depois de anos. "Ué, ele não era o cara? Como deixou chegar nessa situação?" costumamos dizer. Além disso, estava no mesmo sofrimento que o ''salvador''. Se a morte de Jesus foi vicária a morte do bandido, sendo absolutamente igual, representou sua punição. A morte por cruz, comum na época, em si mesma nada representa, não tendo sido exclusividade do salvador. O sofrimento de Jesus em nada o difere dos demais. Aliás, a História está repleta de casos em que o sofrimento por tortura em muito supera a de Jesus.
Podemos também imaginar quais seriam as amarguras desse blasfemador. Sua vida pregressa pode ter sido motivada por sucessivas agressões e sua visão da vida, como contendo alguma coisa boa, tenha se perdido logo na infância. Não seria justo analisar suas motivações? Afinal, o que se espera de Deus senão que tenha compaixão e que saiba que somos vulneráveis ao meio?
Um dos personagens que mais me marcou no clássico Memorial de Maria Moura, de Rachel de Queiroz, é de um traidor que pouco antes da morte, amarrado a um tronco, recebe a visita do padre. Nesse momento da extrema unção o padre pergunta se ele ainda crê em deus e o tal diz: "Deus é luxo!" Ora, reagimos de múltiplas formas diante dos males da vida e a revolta faz parte desse contexto. Além disso, está claro que pessoas cujo lobo frontal é menor tem senso ético e moral quase inexistente. Um defeito congênito que torna o sujeito afeto ao crime, sem remorso, e por isso o condenamos nos tribunais humanos, mas de Deus esperar-se-ia outro entendimento. O ladrão da cruz é mal, e a ele não é dada a possibilidade do bem. Jesus não teve misericórdia!
Quanto ao "bandido bom" só fez por acreditar, mesmo não tendo feito reparos aos males praticados, pode-se dizer que foi um privilegiado, pois quem, na angústia da morte teve a oportunidade de um diálogo desses? Ele reconheceu que Jesus era o salvador e pronto. O cara estava na fragilidade da morte. Não teria sido um ato de desespero diante do fim iminente? Volto à vida que ele teve: que religião teria sido educado? Não sabemos. Pode ter se apegado ao que lhe pareceu ao alcance dos olhos, coisa bem comum. Afinal, ninguém clama por um deus que nunca ouviu falar. Como criminoso teve condenação nas leis do Império. Jesus por sua vez teve condenação pelo Sinédrio (juri judeu) e a decisão foi respeitada por Pôncio Pilatos porque esse era o entendimento do César, de respeitar o justiciamento do povo dominado segundo suas próprias leis. Daí o lavar das mãos representar uma política de Estado, nada mais. Se não foi reparado o mal que praticou não houve justiça e sobre isso Jesus não faz qualquer menção. Salvou o bandido sem que seus males fossem contornados. Que tipo de Deus é esse? Um Deus do bem? Com certeza não. Além de não fazer Justiça bastou uma puxada de saco para transformar um condenado em salvo.
O padrão de análise da nossa conduta por parte de Deus não poderia ser dentro dos nossos padrões. Não o foi para um, mas também não o foi para o outro que, blasfemando, poderia ter do salvador o entendimento da nossa limitação. Esse texto se encaixa perfeitamente na necessidade da religião de colocar-se como caminho único. Ora, é necessário ao cristianismo ter em si mesmo a única opção, do contrário abriria o leque e tiraria de si a autoridade no quesito 'salvação'. Jesus está no centro da decisão, não importando a vida que temos. Daí a história humana não revelar presença divina em coisa alguma e as nossas sociedades seguirem com os condicionamentos humanos permitidos por nossa própria humanidade.
Se Deus não interfere no nosso mundo, a não ser para curar uns e outros de dores de barriga e dar emprego, por que haveríamos de crer em algo superior depois desta existência? Bem, suponho que Deus não seja a manifestação cristã. Deus é outra coisa que não faço a menor ideia do que seja.
"Quem na angústia da morte teve a oportunidade de um diálogo desses?" - não existe dialogo,não existe suplica, em nenhum momento Jesus diz, creiam em mim e eu vos libertarei desta cruz, foi o proprio condenado quem buscou e reconheceu a Jesus.
ResponderExcluir"Não teria sido um ato de desespero diante do fim iminente?" Até seria se alguém naquele momento estivessi pregando um final diferente, algo que não se ve no texto, a não ser por parte do outro malfeitor que diz; se você é realmente o filho de Deus tira-nos daqui, mais jesus em nenhum momento faz promessa de salvar alguém antes.Por que você, vendo uma outra pessoa sofrendo o mesmo que você, sendo condenado como você, o que te levaria a creer que ela poderia te salvar dali, sendo que nem ela esta prometendo isso naquele momento?.
"Volto à vida que ele teve: que religião teria sido educado?" A religião mais provável seria a Judaica, a religião predominante no local. O que me levaria a creer que seria ainda mais dificil ele creer em jesus, sendo educado nesta religião creer que jesus era o filho de Deus era ainda mais improvavel. Na crença deste povo, eles esperavam o messias, um rei da linhagem de Davi que viessi para por fim na repressão investida por Roma, e fazer de Israel um reino prospero e vitorioso. Algo que não se enquadrava nos aspectos de Jesus.
"A morte por cruz, comum na época" Não Sº André, a historia não diz que a morte na cruz era comum naquela epoca. Pelo contrario era a pena maxima, destinada somente aos que eram contra ao impero romano, de modo a envergonhar os inimigos do império. Não era um condenção assim comun, por que existia outras condenações, como fragelos, açoites , e prisões.
"Ora, questionar um cara que está condenado e se apresentou como Filho de Deus não te parece natural?" Pra mim não, não vejo nada de natural você pregado em uma cruz, depois de ter levado inúmeros açoites, ter carregado um pedaço de madeira nas costas, estar preste a morrer de asfixia, falta de sangue, fraco, debilitado pensar, ei você não é o filho de Deus, tira - nos daqui então! Não vejo como uma pessoa naquele estado poderia pensar em questinar alguém.
Com certeza o texto é limitado, realmente concordo com isso, mais temos que pensar que para a época não existia metodos de literatura, ou metodos científicos para registrar alguma história, até por que eles não acreditavam que o tempo se estenderia por 2000 anos. Para os seguidores de cristo, os que presenciaram a Ressureição, cristo logo retornaria e o ato principal seria o de levar a mensagem e não de catalogar ou registrar a mensagem. Essa preocupação veio tempos depois quando perceberam em sua velhice que eles poderiam morrer e cristo ainda não teria voltado, onde então aparece neste periodo os escritores como Lucas, que pesquisa e assim registra os atos e a Hitória de jesus.
O texto é bom, de relexão.