PORQUE SOU AGNÓSTICO (2)
Nasci num lar extremamente religioso. Natural ainda hoje. Até meus seis anos orava com meus avós pela manhã, assíduo nas reuniões da Assembleia de Deus da Vila Elizabeth, bairro Sarandi, zona Norte de Porto Alegre, e aos oito anos ganhei minha primeira Bíblia. Lembro do livro e do momento. Aos 12 anos, morando em Jaguaruna/SC, minha família foi excluída dessa denominação porque tinha televisão (hoje os assembleianos têm programas de TV). Em seguida fomos para a igreja Batista. Lá recebi os fundamentos do cristianismo e me batizei. Aos 17 anos segui para São Paulo, onde cursei Teologia pela Faculdade Batista, bairro Perdizes, até a quinta fase. Ao chegar comprei minha quarta Bíblia, porque as anteriores eu havia destruído pelo uso. Essa guardo até hoje. Em 1986, num embalo de demissões do banco Itaú (trabalhava numa das agências da Avenida Paulista), resolvi voltar para Santa Catarina. Cresci sob os auspícios da doutrina, dos dogmas, das regras, dos princípios como todos os demais cristãos, em geral o são, mas percebendo desde cedo que havia diferenças gritantes dentro do cristianismo.
O fato é que não há religião sem dogma porque são eles que identificam, que delimitam, que dão sentido àquilo que é alvo da fé. Crer é seguir regras, seja lá qual for a fé. Apesar de alguns relutarem em admitir não há a menor, singela que seja, possibilidade de fé em deus e em religião sem a mão pesada da doutrina. Quem diz que não segue dogmas segue o dogma de não seguir dogmas.
Qualquer que seja a religião só será possível dizer-se dela conhecendo seus parâmetros. A estupidez é tal diante desse fato que há quem se negue em seguir essa ou aquela doutrina e ainda diz-se pertencente à crença. Ora, tal pessoa é imbecil ao extremo porque rejeita o que há de mais óbvio nessa relação. Pode ser que seja uma forma de anestesiar a consciência para justificar algumas de suas atitudes. Nesse sentido qualquer iniciativa de sincretismo religioso e ecumenismo são mentiras descaradas.
Porém, no imbróglio que se formou sobre o que é doutrina cristã é necessário olhar a Bíblia como um livro que traz a descrição parcial da formação de uma identidade. Esse livro, ao contrário do que se diz, não é o ‘manual do fabricante’. Longe de ser um livro ‘técnico’ é um livro histórico. Nenhuma doutrina está disposta didaticamente. Há a necessidade de pinçar-se um texto daqui outro dali e, assim, formar um dogma, algo imutável por definição.
Sendo construída ao longo de uns 1,5 mil anos a Bíblia traz informações distantes da nossa realidade, contexto com pouquíssima relação com o nosso. Aceitar que Deus tenha dado aos homens sua verdade por este meio é altamente excludente, pois deixou de revelar-se para povos de outros continentes durante milênios. O Alcorão foi escrito no século VII e, portanto, negou suas verdades aos que viveram antes ou estavam longes. A primeira Bíblia chegou ao continente americano quase 1,5 mil anos depois de Jesus. Que Deus seria tão burro para usar uma estratégia dessas? Se não é burro, de antemão condenou trilhões de gentes à escuridão para privilegiar os que moravam no oriente médio. De todo inaceitável.
Eis que surgem muitas correntes teológicas a partir da Bíblia, o que nos joga num vazio. Ora, em não havendo clareza doutrinária como pode haver identidade? Um dos maiores exemplos do que digo está na divindade de Jesus. No Concílio de Nicéia, início do quarto século do nosso calendário, a discussão foi levada a termo e venceu a ideia de que Jesus é deus, da mesma natureza do Pai. Mas isso foge a muitos dos textos dos evangelhos que são solenemente negados pela maioria dos cristãos. A Trindade, por sua vez, é de difícil ou nenhum entendimento e os textos usados para fundamentá-la são maltratados ao máximo. Outro exemplo é a doutrina do dízimo. Toda a fundamentação dessa contribuição está no Velho Testamento, com uma pinceladinha no livro de Hebreus, quando elogia Abraão por decidir dar 10 por cento de sua renda. Qualquer cristão, minimamente instruído, nega o pagamento do dízimo e a divindade (não a filiação) de Jesus de Bíblia em punho.
Não sendo satisfatório é interessante mencionar que na Torá (cinco primeiros livros da Bíblia, também conhecida por Pentateuco) não há céu, nem inferno. A relação com o deus Javé se dá de forma temporal e o homem (não a mulher) perpetua-se nos filhos.
A Torá não foi suficiente para o povo Judeu e seus rabinos escreveram o Talmud. Os islâmicos também não conseguiram se limitar ao Corão e escreveram a Suna. Os cristãos são campeões, pois anualmente milhares de livros são editados para traduzirem aos fiéis a Bíblia. Altamente incompetentes para lidarem com o que está diante dos olhos, são capazes de dizer que o Espírito Santo revela o que está escrito. Ora, para que pregações, para que livros, para que estudos se o ES é assim dão atuante? E por que Deus revelaria sua revelação (Bíblia)?
No livro de II Timóteo 3.16-17 diz que “Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente preparado para toda boa obra”. Ora, se são assim mesmo não seria necessário qualquer Espírito para revelar a revelação. Contudo esse texto é usado pelos crentes para dar base a toda a Bíblia, mas se refere apenas ao Velho Testamento, palavra de deus conhecida do apóstolo Paulo, autor desse verso. Fosse a verdade, a Bíblia seria autoexplicativa e qualquer um leria e chegariam todos às mesmas conclusões. O que, de fato, não ocorre.
Diante do visível desprezo de deus em se fazer entender uniformemente diante dos homens, por que eu haveria de seguir esse ou aquele modelo, essa ou aquela escritura? Diriam alguns que essa diversidade é fruto da maldade humana. Pode ser. Mas mesmo assim a manutenção da verdade dele é do interesse dele e muito mais condições de se fazer entender ele tem do que mandar humanos explicar sua revelação através de uma suposta revelação do Espírito Santo. Parece que o Deus cristão adotou o "pra quê simplificar se posso complicar?".
Por fim, conclui-se que a identidade da fé está absolutamente comprometida dada a não clareza de sua fonte. Assim, me restou abandonar a tudo que se refere a Deus pela mais absoluta incerteza.
O próximo texto trata das bases da fé recorrente que você lê clicando AQUI.
O fato é que não há religião sem dogma porque são eles que identificam, que delimitam, que dão sentido àquilo que é alvo da fé. Crer é seguir regras, seja lá qual for a fé. Apesar de alguns relutarem em admitir não há a menor, singela que seja, possibilidade de fé em deus e em religião sem a mão pesada da doutrina. Quem diz que não segue dogmas segue o dogma de não seguir dogmas.
Qualquer que seja a religião só será possível dizer-se dela conhecendo seus parâmetros. A estupidez é tal diante desse fato que há quem se negue em seguir essa ou aquela doutrina e ainda diz-se pertencente à crença. Ora, tal pessoa é imbecil ao extremo porque rejeita o que há de mais óbvio nessa relação. Pode ser que seja uma forma de anestesiar a consciência para justificar algumas de suas atitudes. Nesse sentido qualquer iniciativa de sincretismo religioso e ecumenismo são mentiras descaradas.
Porém, no imbróglio que se formou sobre o que é doutrina cristã é necessário olhar a Bíblia como um livro que traz a descrição parcial da formação de uma identidade. Esse livro, ao contrário do que se diz, não é o ‘manual do fabricante’. Longe de ser um livro ‘técnico’ é um livro histórico. Nenhuma doutrina está disposta didaticamente. Há a necessidade de pinçar-se um texto daqui outro dali e, assim, formar um dogma, algo imutável por definição.
Sendo construída ao longo de uns 1,5 mil anos a Bíblia traz informações distantes da nossa realidade, contexto com pouquíssima relação com o nosso. Aceitar que Deus tenha dado aos homens sua verdade por este meio é altamente excludente, pois deixou de revelar-se para povos de outros continentes durante milênios. O Alcorão foi escrito no século VII e, portanto, negou suas verdades aos que viveram antes ou estavam longes. A primeira Bíblia chegou ao continente americano quase 1,5 mil anos depois de Jesus. Que Deus seria tão burro para usar uma estratégia dessas? Se não é burro, de antemão condenou trilhões de gentes à escuridão para privilegiar os que moravam no oriente médio. De todo inaceitável.
Eis que surgem muitas correntes teológicas a partir da Bíblia, o que nos joga num vazio. Ora, em não havendo clareza doutrinária como pode haver identidade? Um dos maiores exemplos do que digo está na divindade de Jesus. No Concílio de Nicéia, início do quarto século do nosso calendário, a discussão foi levada a termo e venceu a ideia de que Jesus é deus, da mesma natureza do Pai. Mas isso foge a muitos dos textos dos evangelhos que são solenemente negados pela maioria dos cristãos. A Trindade, por sua vez, é de difícil ou nenhum entendimento e os textos usados para fundamentá-la são maltratados ao máximo. Outro exemplo é a doutrina do dízimo. Toda a fundamentação dessa contribuição está no Velho Testamento, com uma pinceladinha no livro de Hebreus, quando elogia Abraão por decidir dar 10 por cento de sua renda. Qualquer cristão, minimamente instruído, nega o pagamento do dízimo e a divindade (não a filiação) de Jesus de Bíblia em punho.
Não sendo satisfatório é interessante mencionar que na Torá (cinco primeiros livros da Bíblia, também conhecida por Pentateuco) não há céu, nem inferno. A relação com o deus Javé se dá de forma temporal e o homem (não a mulher) perpetua-se nos filhos.
A Torá não foi suficiente para o povo Judeu e seus rabinos escreveram o Talmud. Os islâmicos também não conseguiram se limitar ao Corão e escreveram a Suna. Os cristãos são campeões, pois anualmente milhares de livros são editados para traduzirem aos fiéis a Bíblia. Altamente incompetentes para lidarem com o que está diante dos olhos, são capazes de dizer que o Espírito Santo revela o que está escrito. Ora, para que pregações, para que livros, para que estudos se o ES é assim dão atuante? E por que Deus revelaria sua revelação (Bíblia)?
No livro de II Timóteo 3.16-17 diz que “Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente preparado para toda boa obra”. Ora, se são assim mesmo não seria necessário qualquer Espírito para revelar a revelação. Contudo esse texto é usado pelos crentes para dar base a toda a Bíblia, mas se refere apenas ao Velho Testamento, palavra de deus conhecida do apóstolo Paulo, autor desse verso. Fosse a verdade, a Bíblia seria autoexplicativa e qualquer um leria e chegariam todos às mesmas conclusões. O que, de fato, não ocorre.
Diante do visível desprezo de deus em se fazer entender uniformemente diante dos homens, por que eu haveria de seguir esse ou aquele modelo, essa ou aquela escritura? Diriam alguns que essa diversidade é fruto da maldade humana. Pode ser. Mas mesmo assim a manutenção da verdade dele é do interesse dele e muito mais condições de se fazer entender ele tem do que mandar humanos explicar sua revelação através de uma suposta revelação do Espírito Santo. Parece que o Deus cristão adotou o "pra quê simplificar se posso complicar?".
Por fim, conclui-se que a identidade da fé está absolutamente comprometida dada a não clareza de sua fonte. Assim, me restou abandonar a tudo que se refere a Deus pela mais absoluta incerteza.
O próximo texto trata das bases da fé recorrente que você lê clicando AQUI.
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