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    SOBRE A TRISTEZA NO NATAL

    Se você é cristão sugiro pensar neste texto do sábio Salomão antes das festas de Natal e passagem de ano e, se for o caso, festa de aniversário:

    "Melhor é a boa fama do que o melhor unguento, e o dia da morte do que o dia do nascimento de alguém. Melhor é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há banquete, porque naquela está o fim de todos os homens, e os vivos o aplicam ao seu coração. Melhor é a mágoa do que o riso, porque com a tristeza do rosto se faz melhor o coração. O coração dos sábios está na casa do luto, mas o coração dos tolos na casa da alegria. Melhor é ouvir a repreensão do sábio, do que ouvir alguém a canção do tolo." (Eclesiastes 7:1-5)

    É evidente que ninguém vai se lembrar disso antes de uma festa e, muito menos, para realizar uma festa. E o que fazer com isso? Nada. Muito melhor a festa, as comemorações, do que velórios. Mas o que Salomão quis com isso? No contexto do livro, pelo que posso atingir, ele leva o pensamento ao que há de mais básico da nossa realidade e trata a vida com franqueza: o que nos faz crescer e aprender sobre a vida é o sofrimento.

    Uma senhora que perdeu seu filho de 21 anos num acidente disse-me que não queria o "bônus por este ônus". Ela abria-mão de qualquer lição, de qualquer crescimento como pessoa, para ter seu filho consigo. Perfeito! Ainda mais que se fosse para ter alguma lição teríamos que aceitar que uma vida foi ceifada para outra ter uma experiência. Coisa que um Ser superior determina e pronto. O que, convenhamos, não serve de consolo algum. Não serve nem para ser dito, como muito fazem, com a vã esperança de dar algum sentido às circunstâncias. Um Ser desses de nada tem de superior!

    Salomão vê sentido na vida. Ele crê que temos que crescer, que evoluir, e por isso fala que o sábio se dedica em ver quão somos limitados. Não creio dessa forma. Para mim a vida não tem qualquer sentido, qualquer lógica, qualquer razão de ser. Vejo-nos como fruto de mero acidente biológico. Somos como qualquer outro ser vivo. Tanto que, em se tratando de postura equilibrada e sábia há quem o seja sem ter passado por experiências difíceis. Há ainda os que diante de situações aterradoras ficam traumatizados e engessam suas vidas, passando a viver como moribundos, mortos-vivos, sem ânimo, sem alegria, sem vontade. Ora, as circunstâncias ruins não produzem frutos bons sempre. Além disso, há quem ''adore'' um velório, tragédias e mortes (note que os maiores índices de audiência em telejornais é de catástrofe) e ainda assim não passam de pessoas superficiais.

    E por que da tristeza que se sente no Natal? É evidente a relação que fazemos com festa, alegria, gente reunida, pois há esse registro em nossas vidas, fruto da família ou mesmo do que vimos ao longo dos anos nos outros. Olhamos para os grupos e há uma nítida exaltação, euforia e uma felicidade que não encontramos referência em nós mesmos. Ora, o que vemos é somente o que demonstram e isso nos afeta. É uma especie de inveja. Somos atropelados pela inveja. Não se trata de alegrias falsas nos outros, mas de tristeza verdadeira em nós pela referência que fazemos. Ora, quem nunca passou pelo Natal não fará essa relação. Não é a data, mas as ligações internas.

    De minha parte desliguei essas relações. O Natal, nem a passagem do ano, não me afeta, não me importuna, não me entristece e nem me alegra. Desconectei e isso me faz muito bem. É uma das vantagens da maturidade. Consegui faz muitos anos e não sei ao certo o que fiz. Apenas desconectei, vou dormir mais cedo e em plena paz.

    Mas há algo sobre o Natal que pesa muito mais como a psicóloga Catarina Mexia faz menção: "O divórcio é outra das situações particularmente difíceis para viver na época natalícia. É necessário reorganizar a família, construir novas formas de celebrar e novos motivos de celebração. O círculo social transforma-se, especialmente no primeiro ano. Os amigos do outro, ou de ambos, podem já não fazer parte das relações mais próximas. As crianças continuam a esperar um Natal cheio de prendas. E o consumismo que nos caracteriza não é compatível com a perda de capacidade financeira resultante de uma separação."

    A dura realidade de adequar a vida ao que de fato ela é e não a estas festividades absolutamente passageiras e transitórias traz desafios de verdade. Muito mais que encarar um fato consumado como a morte é ter que adaptar-se às novas relações que a liberdade nos proporciona. Quando era vergonhoso divorciar-se a divisão das famílias era coisa rara, afeta à morte de um ou outro. (Interessante é que a viuvez era alvo de compaixão e o divórcio de distanciamento, de reprimenda, de outras tantas divisões. Que ''amiga'' queria uma divorciada em sua casa e dividir a atenção do marido?) Porém, hoje há o ônus de refazermos o conceito de família e da própria festa natalina. E neste quesito não há uma palavra do sábio Salomão. Na realidade dele as famílias não se separavam como vemos hoje e ele, como pai, não foi um bom exemplo.

    Se resta alguma sabedoria a ser perseguida neste momento é a de não perder um segundo sequer com o Natal, porque a vida vai muito além desse sentimentozinho frívolo de ''solidariedade e amor'' que se vê.

    Conecte-se com a vida!

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