A REAÇÃO À CRISE DO CARVÃO 1980-1990
A REAÇÃO À CRISE DO CARVÃO 1980-1990
André Roldão
Charlene Cardoso professor-Tutor Externo
Centro Universitário Leonardo da Vinci -
UNIASSELVI
Curso História HID24
– Prática do Módulo IV
22/11/2016
RESUMO
O presente artigo tem como
principal objetivo registrar um dos momentos mais críticos da economia de
Criciúma e região com a queda da produção de carvão na última década do século
XX. Além disso, cumpre entender como as empresas e o poder público reagiram à
crise, as saídas encontradas e a mudança de eixo econômico que se verificou
concomitante à queda acentuada de postos de trabalho daquele setor.
Palavras-chave: carvão, crise econômica, vestuário
1 INTRODUÇÃO
A história econômica de Criciúma é marcada pela exploração
do carvão mineral, sendo principal motriz de geração de riqueza, emprego e renda,
durante décadas. De uma pequena cidade de imigrantes europeus com 27.753
habitantes em 1940,
para 81.451 em 1970.
Um crescimento de 193% em 30 anos, tornando-a polo regional e superando cidades
mais antigas como Laguna, Tubarão e Araranguá.
Tal crescimento populacional
se deu por conta a incrível geração de empregos gerados pela produção de carvão
e os negócios fomentados a partir de sua exploração. A partir da segunda metade
da década de 1980 teve um abrupto revés econômico com o fechamento de minas e
demissões oriundas da queda de produção. A cidade se viu mergulhada em crise
social, com fatores externos e internos, tanto para a queda como para a
superação que se viu em tão poucos anos.
Assim, fatores históricos, culturais, sociais,
geográficos entre outros, torna-se um prato cheio para historiadores e
jornalistas desejosos de entender fenômenos como o de Criciúma.
Neste trabalho vamos analisar números da economia e empresariais das
últimas décadas do século passado. Também foram feitas entrevistas com quem
esteve no centro da crise e como buscaram soluções no curto e no médio prazos
para amenizar os impactos sociais, principalmente, para com as classes de menor
poder aquisitivo.
2 O CICLO
DO CARVÃO
“A descoberta do carvão
foi pelo Sr. Giácomo Sonego, em suas terras, já no ano de 1904, sendo usado em
ferrarias da localidade para aquecer fornos.”[1] Porém,
pesquisas em torno do carvão do Estado de Santa Catarina deram seus passos
quase um século antes da exploração iniciar. “Já em 1832 o naturalista
Friedrich Sellow fez as primeiras anotações sobre o carvão catarinense.”[2] Apesar
disso, somente em 1915 se dá o início da exploração do carvão mineral em
Criciúma, pressionada pela demanda da Primeiro Guerra Mundial, de forma muito
rudimentar, com a primeira mina no bairro Pio Correa (posteriormente veio a ser
conhecida como a “Mina Modelo” de visitação pública) e sem uma estrutura
adequada de transporte, que começou a ser construída com a estrada de ferro
Dona Tereza Cristina de 1920-1930. Em 1925, vindo a emancipação do município,
desmembrando-se de Araranguá, a população era estimada em 8.500 habitantes.
A diversificação industrial
da economia de Criciúma estabeleceu novo ciclo de investimentos a partir da
década de 1940. Porém, o carvão manteve-se como principal fonte de riquezas com
a necessidade urgente de fornecimento por conta da Segunda Guerra Mundial
(1939-1945). Com recursos abundantes da mineração surgem as cerâmicas. Em “iniciou
em 1947, com o surgimento da cerâmica Santa Catarina Ltda” que “em 1973 adotou
a marca de Azulejo Cesaca. (...) Em 1966 foi fundada a Cecrisa, no Bairro
Próspera, iniciando sua produção de azulejo em 1971.”[3]
Segundo Filho (1997)
Num primeiro momento, a indústria carbonífera cumpriu
seu papel, como indústria motriz de menor proporção, impulsionando o
desenvolvimento da metalúrgica, atacado de ferragens e outras pequenas
atividades urbanas. Num segundo momento, a indústria cerâmica será a indústria
motriz de maior proporção que impulsionou outras atividades industriais, além
de novas metalúrgicas, fornecedores de insumos como esmaltes, indústria
química, embalagens e transportadoras.[4]
Já na década de 1970 surge outra
indústria no cenário criciumense: as confecções do vestuário que “também
desempenham este papel de impulsionadoras, proporcionam o surgimento de
lavanderias, bordadeiras, serigrafias e outras atividades paralelas”.[5]
Esta década foi igualmente marcada por mais um boom do carvão com a crise do petróleo de 1973. Vindo nova crise do
petróleo em 1979 a produção de carvão ganha novo e derradeiro impulso.
Criciúma experimenta o auge do ciclo
do carvão em meados da década de 1980. Em 1985 obtém a maior produção de CPL
(carvão pré-lavado) da história da região carbonífera com 4,3 milhões de
toneladas. Filho (1997) registra o processo que culmina no fechamento das minas
em Criciúma:
Cabe ressaltar que a partir de 1986, o governo
anunciava constantes avisos de que a política nacional do carvão iria mudar: em
1986 começou a reduzir os subsídios ao transporte do carvão e em meados dos
anos 80 aumenta substancialmente a importação do carvão metalúrgico.[6]
Como fonte de energia termoelétrica o
carvão também se tornou alternativa para a base energética do Brasil, assim
como as usinas termonucleares. De iniciativa do governador Jorge Lacerda surge,
em 1957, Complexo Termelétrico Jorge Lacerda.
A Jorge Lacerda foi pioneira em Santa
Catarina e na região Sul (era a maior geradora na década de 1960). Nos
primórdios, a energia era gerada e distribuída de forma isolada. Mas a fundação
das subsidiárias da Eletrobras, criada em 1962 pelo presidente João Goulart,
permitiu que, ao longo do tempo, essas usinas independentes formassem um
conjunto, chamado de sistema elétrico interligado, o atual SIN (Sistema
Interligado Nacional). Por isso, o Complexo Termelétrico Jorge Lacerda acabou
incorporado à Eletrosul em 1972, passando ao controle privado – da Tractebel
Energia GDF Suez – no final da década de 1990, de acordo com a política de
privatizações do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB).[7]
Assim, finalmente com a abertura do
mercado ao produto internacional promovida pelo presidente da república,
Fernando Collor de Mello, a produção cai para 1,1 milhão de toneladas em 1990.
“O que manterá a economia da região nos trilhos será a diversificação no parque
fabril, como a cerâmica, o vestuário, o calçado, o setor químico, o
metal-mecânico e o de molduras”.[8]
3 MÃO-DE-OBRA
A demanda por mão-de-obra advinda da
exploração do carvão atraiu gentes de todas as partes, verificando-se um
crescimento vertiginoso da população de Criciúma e região. Tal massa trabalhadora
era de baixa qualificação e de fácil mobilidade migratória por não possuir
posses ou deixarem famílias para trás.
Em 1925 Criciúma tinha cerca de 8.500
habitantes. Já na década de 1940 chegou a quase 28 mil pessoas, saltando para
mais de 80 mil habitantes nos anos de 1970. Evolução diretamente ligada ao
carvão e à diversificação dos novos investimentos nos setores cerâmicos e de
vestuário, juntamente com as empresas surgidas a partir desses seguimentos. No
quadro a seguir o crescimento populacional a partir de 1940, Wikipédia[9]:
A
constituição da cidade movidos pelos dos vários setores ligados ao carvão,
cerâmica ou vestuário, tais como moradia, comércio em geral, passa a sustentar
a demanda conforme é atingida pelo crescimento econômico e populacional. Um dos
exemplos é o surgimento de conjuntos habitacionais como da Cidade Mineira
(1957) e o da Mina 4 (atualmente bairro Renascer), durante a gestão de José
Augusto Hülse (1983-1988).
4 A REAÇÃO À CRISE
O fechamento das minas de carvão em Criciúma, no início da década de
1990, trouxe mudanças drásticas para o Sul de Santa Catarina. Diante da crise
abrupta, dada a importação de coque metalúrgico pelo governo Federal, mais
barato e de melhor qualidade calorífica, as empresas do setor viram-se sem
outra saída senão pararem sua produção. Tal condição resultou em milhares de
desempregados. Diante do momento, quando “o número de mineiros empregados
diminui de 12.000 para 3.500, o faturamento das empresas passa de US$ 13 milhões
a US$ 6 milhões por ano (Gazeta Mercantil, 4/4/1995) A produção carbonífera de
Criciúma decresce de 420.000 a 180.000 toneladas no período”[10],
ações emergenciais precisavam ser tomadas.
O presidente do Sindicato da Indústria do Vestuário de Criciúma e Região
(Sindivest), à época, Diomício Vidal, reuniu empresários do setor para discutir
a situação, pois ninguém estava a salvo, mesmo que a confecção tivesse seu
maior faturamento com vendas para outras regiões do país. No encontro foi
decidido que as confecções priorizariam a contratação de mão-de-obra das
famílias atingidas. “Ficamos muito preocupados com as famílias e precisávamos
fazer alguma coisa para amenizar o impacto do desemprego em alta e em tão pouco
tempo”, disse Vidal em entrevista a este autor. Naquele momento haviam cerca de
200 empresas ligadas à entidade. O resultado pode ser conferido no gráfico 2, a
seguir:
GRÁFICO 2 – Número de trabalhadores no Sul catarinense nos principais
setores produtivos em 1994
Concomitante à decisão do sindicato, foi verificado um incremento no
número de facções, pequenas e micro, que somente montam as peças para outras
empresas como detentoras de marcas (Wrangler, Staroup, outras), e para grandes
redes varejistas como a Renner, por exemplo. Da mesma forma cresceu o número de
lavanderias industriais, tendo a Acqua Lavanderia como pioneira em meados da
década de 1970. Porém, não há registros no sindicato possíveis de serem
consultados atualmente.
A estrutura da indústria da confecção vivia um bom momento com grande
crescimento. Em 1978, quando surgiu o Sindivest, estavam constituídas apenas 26
confecções em Criciúma. Com o incremento no setor surgiram, além de
lavanderias, empresas de insumos para confecções como a Dorlytex, que fornecia
elásticos. Nessa época a região contava apenas com a loja de máquinas
industriais Peruchi. A partir dos anos de 1980 uma rede de assistência técnica
e de fornecedores estava instalada e crescendo juntamente com o segmento. Essa
base forte fez com que Criciúma e região superasse o impacto do desemprego nas
minas de carvão e seus efeitos não tenham sido tão drásticos.
Prefeito de 1989 a 1992, Altair Guidi, entrevistado por este autor, tomou
ações rápidas em parceria com o governador Vilson Kleinubing. Iniciou a
pavimentação de ruas com lajotas que absorveu parte da mão-de-obra. Junto com a
Associação Empresarial (Acic) incentivou as mulheres a profissionalizarem-se e,
como suporte, construiu creches, como a do bairro Boa Vista e no Lapagesse,
Centro. “O governo Federal errou ao não preparar a região para o fechamento das
minas como fez o governo da Alemanha com o mesmo caso naquele país”, disse
Guidi. Para o prefeito a decisão de Collor de Mello atingiu toda a macrorregião
Sul, pois o Lavador de Capivari, bem como a Indústria Carbonífera Catarinense
(ICC), que produzia insumos a partir do minério, fecharam as portas. Criciúma,
sendo polo regional ficara no centro do problema. Contudo, observou Altair,
esse momento resultou em mais diversificação da economia local e seu efeito foi
positivo com o tempo.
3 CONCLUSÃO
A história de Criciúma
revela o quanto circunstâncias inimagináveis podem dar rumos a uma cidade. De
uma descoberta acidental, mesmo que posteriormente teria vindo a ser
descoberto, o carvão mudou completamente o cenário local e regional. Advindas
as grandes guerras mundiais (1914 e 1939) a demanda teve impulso vertiginoso.
Não bastasse tais acontecimentos as crises do petróleo de 1973 e 1979 exigiram
ainda mais. E veio a estabelecer-se como base energética na produção de eletricidade
a partir da década de 1950 com o Complexo Jorge Lacerda.
O município, capitaneando
a região, soube superar momentos de intensa crise. No espaço de uma década,
apenas um setor, o do carvão, chega a 15 mil trabalhadores e cai para menos de
três mil. A ação coordenada de absorção de mão-de-obra e da diversificação da
indústria estabeleceram um novo ciclo virtuoso com a cerâmica, o vestuário,
indústria química e tantas empresas ligadas a estes setores.
O presente trabalho fez
por registrar este momento da economia que afetou direta e indiretamente os
cidadãos de Criciúma e região, bem como seus agentes políticos a mostrar o
vigor produtivo que permeia o Sul de Santa Catarina.
REFERÊNCIAS
PIMENTA, Margareth de Castro Afeche. Flexibilidade produtiva e vida urbana no sul catarinense. 2003. unuhospedagem.com.br/revista/rbeur/index.php/anais/article/download/2003/1966
FILHO, Alcides Goularti; NETO, Roseli Jenoveva. A indústria do vestuário. Criciúma: Letras
Contemporâneas, 1997.
Wikipédia. Criciúma. Acesso
em 19 de novembro de 2016. https://pt.wikipedia.org/wiki/Crici%C3%BAma#Evolu.C3.A7.C3.A3o_populacional
Notícias do Dia. Memória de Santa Catarina - Termelétrica Jorge Lacerda
rumo aos 50 anos. Acessado em 18
de Novembro de 2016. http://ndonline.com.br/florianopolis/coluna/carlos-damiao/memoria-de-santa-catarina-termeletrica-jorge-lacerda-rumo-aos-50-anos
Câmara de Vereadores de Criciúma. Evolução Urbana e Ciclos Econômicos. http://www.camaracriciuma.sc.gov.br/historia-criciuma-ver/evolucao-urbana-e-ciclos-economicos-12
[1] Câmara
de Vereadores de Criciúma.
[3] Op cit
Pág. 25
[4] Op cit
Pág. 25
[5] Op cit
Pág. 26
[6] FILHO,
Alcides Goularti; NETO, Roseli Jenoveva. 1997. Pág. 33.
[7] Notícias do Dia. Memória de Santa Catarina - Termelétrica Jorge Lacerda
rumo aos 50 anos. Acessado
em 18 de novembro de 2016.
http://ndonline.com.br/florianopolis/coluna/carlos-damiao/memoria-de-santa-catarina-termeletrica-jorge-lacerda-rumo-aos-50-anos
[8] FILHO,
Alcides Goularti; NETO, Roseli Jenoveva. 1997. Pág. 34.
[9] Wikipédia.
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